Jair Bolsonaro confirma que contraiu coronavírus e diz: 'Estou muito bem'

08/07/2020

 O presidente Jair Bolsonaro confirmou, nesta terça-feira (7), que contraiu o novo coronavírus. Ele fez o anúncio para a TV estatal e outras duas emissoras. Nenhum dos demais órgãos de imprensa foi convidado. Bolsonaro disse que decidiu divulgar o resultado do teste feito na segunda (6) assim que ele saiu e que recebeu a notícia com naturalidade.

 
O presidente afirmou que começou a se sentir mal no domingo (5), com uma certa indisposição. E que, na segunda, a situação se agravou. Disse que teve mal-estar, cansaço, um pouco de dor muscular e febre de 38 graus no fim do dia, e que foi ao Hospital das Forças Armadas fazer os exames. Segundo o presidente, uma tomografia mostrou que os pulmões estavam limpos.
 
O presidente também falou de um assunto que tem repetido exaustivamente: a cloroquina. Bolsonaro disse que, na segunda mesmo, antes de saber o resultado do exame, no hospital, a equipe médica resolveu dar o primeiro comprimido do medicamento, por volta das 17h, e também um antibiótico. O presidente disse que, depois da meia-noite, já se sentia melhor, e que tomou a segunda dose nesta terça, às 5h.
 
As palavras são do presidente: “Estou muito bem. Estou até com vontade de dar uma caminhada por aqui. Não vou fazê-lo por recomendação médica, mas estou muito bem. Acredito que não só pelo atendimento que tive dos médicos, mas pela forma como ministraram a hidroxicloroquina.”
 
 
No anúncio desta manhã, o presidente voltou a criticar as medidas de isolamento. Repetiu que houve um superdimensionamento e que as medidas deveriam ser voltadas apenas para idosos acima de 65 anos ou com doenças pré-existentes. O presidente tem 65 anos.
 
Bolsonaro não apresentou nenhum dado para amparar a afirmação de que o número de óbitos tem aumentado por outras causas, e não pelo vírus. Ele citou aumento de casos de suicídio e de doentes que não procuram os médicos por medo de se contaminar.
 
Mais uma vez minimizando a tragédia da pandemia, o presidente disse que o coronavírus é quase como uma chuva, que vai atingir alguns e outros não. E, depois de recomendar cuidado aos mais idosos, em especial os que têm comorbidades, Bolsonaro disse o seguinte: "Os mais jovens tomem cuidado. Mas se for acometido do vírus, fique tranquilo, porque, para vocês, a possibilidade de algo mais grave é próximo de zero.”
 
A declaração do presidente Bolsonaro vai em sentido contrário ao que dizem várias pesquisas internacionais. Cientistas atestam que o medicamento não tem eficiência no tratamento do coronavírus, e pior: pode ter efeitos colaterais perigosos.
 
No exame que deu positivo, o nome registrado é "Jair Messias Bolsonaro", diferentemente de outros três exames que o presidente fez e só divulgou depois de uma disputa judicial. Nesses, Bolsonaro tinha usado nomes fictícios. O exame apresentado nesta terça (7) é o teste molecular, o PCR, que detecta a presença do vírus no organismo e é feito colhendo material do nariz ou da garganta. O resultado foi "Detectado". O material foi coletado na noite de segunda (6) e o resultado liberado na manhã desta terça.
 
Ao anunciar o resultado, o presidente Jair Bolsonaro informou que começou a tomar hidroxicloroquina na segunda mesmo, no hospital.
 
Especialistas e autoridades em saúde reafirmam que não há comprovação científica da eficácia da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19 e alertam para o risco dos efeitos colaterais, que podem agravar a situação do paciente.
 
 
O infectologista Jean Gorinchteyn aponta os riscos para o coração. “Qual o grande problema de você usar uma medicação que, na bula, já está escrito ‘risco de arritmias cardíacas’? Quando você tem o coronavírus, você tem o vírus passeando por todo o organismo. Entre eles, os músculos. E nós temos um músculo chamado músculo cardíaco. Ele pode ser comprometido pelo coronavírus. Ou seja, coronavírus comprometendo coração por si só pode levar à arritmia. Agora, imagina eu usar uma droga, uma medicação, que pode ter como efeito colateral a arritmia. Eu coloco uma sobreposição de fatores de risco para esse paciente. Portanto, não é uma droga indicada. Nós já vimos vários históricos de pacientes que usaram essa medicação, estavam muito bem, e fizeram uso da cloroquina e tiveram arritmia no terceiro, quarto dia e infelizmente morreram”, afirma.
 
A Organização Mundial da Saúde suspendeu os ensaios clínicos com a hidroxicloroquina contra a Covid. Segundo a organização, as evidências científicas apontam que a substância não reduz a mortalidade em pacientes internados com a doença.
 
Natalia Pasternak Taschner, pesquisadora do Instituto Questão de Ciência, teme que declarações sem base na ciência levem pessoas a tomar a droga sem indicação.
 
“Ele dá a impressão de que a cloroquina está lhe fornecendo algum tipo de segurança, e não está. Então a cloroquina não vai afetar o estado dele, a progressão da doença, o fato dele estar doente ou não. A cloroquina não faz a menor diferença, além de um certo risco cardíaco que ela traz. Então, em relação à cloroquina, tanto faz ele estar tomando ou não. Isso não vai protegê-lo da doença, isso não vai protegê-lo de desenvolver uma fase grave. Esse exemplo é muito preocupante. As pessoas podem entender que o presidente tem Covid, mas passa bem por causa da cloroquina, e isso não procede, não existe essa relação”, explica.
 
 
Sobre a declaração do presidente de que jovens devem ficar tranquilos, também não é o que dizem os médicos nem os milhares de brasileiros que perderam parentes bem jovens para o coronavírus.
 
Dados oficiais em todo o mundo mostram que pessoas jovens, mesmo sem doenças pré-existentes, também podem sofrer de formas graves da Covid-19. A Secretaria de Saúde de São Paulo registrou, nesta terça (7), que 25,4% dos mortos por Covid no estado tinham menos de 60 anos.
 
O coordenador científico da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Sérgio Cimerman, alerta que não há idade para os cuidados: jovens e idosos devem tomar todas as medidas para evitar o contágio.
 
“Pessoas jovens podem pegar Covid-19 mesmo não tendo comorbidade alguma. Visto que nós já tivemos vários casos no Brasil e sobretudo nos Estados Unidos, inclusive casos que foram a óbito. Então, todo o cuidado é pouco. Nós já temos em torno de mais de 66 mil casos de óbitos no nosso país e nós temos vários jovens acometidos. Então, nós temos que sempre tomar as rédeas da situação e seguir as medidas de prevenção que nós todos conhecemos: o distanciamento social, o uso de máscaras, isso é muito importante, e a higienização das mãos”, explica.
 
Nesta terça, o presidente defendeu o cuidado com os mais velhos. Mas o próprio Bolsonaro, que tem 65 anos, tem feito reuniões e participado de cerimônias, quase sempre sem máscara, e cumprimentando as pessoas com apertos de mãos e abraços. Outros integrantes da equipe de governo também estão no grupo de risco, como o ministro da Economia, Paulo Guedes, que tem 70 anos.
 
O infectologista Jean Gorinchteyn afirmou que o presidente, nesta terça, no próprio anúncio sobre o resultado do exame, desrespeitou as regras de distanciamento social e colocou em risco as equipes das emissoras de TV que foram convocadas.
 
 
“No momento em que alguém abaixou a máscara, eu já perdi a regra número um. Eu não tenho distanciamento, eu perdi a regra número dois. Então, as chances proporcionais tendem a aumentar”, diz.
 
Bolsonaro disse ainda que o novo coronavírus é "como uma chuva" e vai atingir a maioria das pessoas. Também não há comprovação científica sobre isso. Na Espanha, por exemplo, onde o pico da doença já ficou para trás, as pesquisas mostram que apenas cerca de 5% da população foi contaminada.
 
“Nós não sabemos, se nada for feito, qual a proporção da população que poderá ter a doença, 50%, 60%, 70% ou 80%. Com base em dados muito cuidadosamente produzidos por um dos mais importantes grupos de epidemiologia que temos no Brasil, o grupo de Pelotas, que nós temos uma média nacional de cerca de 4% das pessoas que já tiveram a doença. Se nós chegarmos a 50%, nós teremos 10 vezes mais casos. Significa que se nós tivemos até agora cerca de 66 mil mortes, nós teremos 660 mil mortes, e daí para frente. Se for 70%, nós vamos chegar muito perto de 1 milhão de mortes. É um preço altíssimo que o país não deve pagar por deixar de fazer aquilo que tem que fazer em relação à proteção das pessoas. Vai ser muito sofrimento, muita morte, que pode ser evitado se todo mundo fizer o que tem que fazer, especialmente se a orientação dos governos for clara e se o suporte dos governos for objetivo para que as pessoas possam se manter em casa”, afirma o pesquisador da Fiocruz Claudio Maierovitch.
 
Fonte: G1

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