Cloroquina, tratamento precoce, falas de Bolsonaro: os temas que o ministro da Saúde evitou na CPI

07/05/2021

 O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, evitou nesta quinta-feira (6), durante depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid responder a diversas perguntas dos senadores.

 
Parte dessas questões refere-se a temas já defendidos publicamente pelo presidente Jair Bolsonaro, como a adoção do tratamento precoce e da hidroxicloroquina (veja mais abaixo).
 
Para justificar, o ministro argumentou que não iria emitir “juízo de valor” a respeito das opiniões do presidente da República ou de qualquer pessoa. A ausência de um posicionamento provocou descontentamento entre a cúpula da CPI.
 
“Não é juízo de valor, é o exercício do cargo que Vossa Excelência exerce. Vossa Excelência é a principal autoridade de saúde do Brasil. Nós estamos perguntando nessa condição e levando em conta a sua biografia, porque eu conheço muitos dos seus amigos que dizem que o senhor é uma pessoa boa, verdadeira. Este depoimento tem que expressar a verdade – e apenas a verdade”, disse o relator da comissão, senador Renan Calheiros (MDB-AL).
 
“Ministro, o senhor está aqui como testemunha. Então, não tem esse negócio de jogar para terceiro”, afirmou o presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM).
 
Diante da ausência de respostas assertivas, o presidente da comissão chegou a ameaçar encerrar a sessão.
 
“Acho que o senhor não entendeu a sua posição aqui. O senhor é testemunha, tem que dizer 'sim' ou 'não'. O senhor está aqui como ministro da Saúde e como médico. Então, eu peço para vossa excelência responder. Senão, nós vamos encerrar esta reunião agora, nem vamos continuar”, afirmou Aziz.
 
Confira alguns dos temas sobre os quais o ministro evitou responder objetivamente:
 
Gestões anteriores
O ministro da Saúde evitou comentar a atuação dos antecessores. Ao ser perguntado pelo senador Renan Calheiros sobre a condução anterior em questões como a articulação com estados e municípios, transparência e monitoramento de insumos, Queiroga disse que somente poderia falar pelos fatos que testemunhou.
 
“Senador, de maneira objetiva. Eu sou aqui testemunha e eu posso testemunhar pelos fatos que eu presenciei. E isso se deve aos 45 dias que eu estou à frente do Ministério da Saúde. Essa função de avaliar os meus antecessores, não só o meu antecessor imediato como os demais, existem instâncias próprias para fazer esse tipo de avaliação”, disse.
Tratamento precoce
Queiroga enfrentou diversos questionamentos sobre opinião pessoal dele a respeito da adoção do chamado "tratamento precoce" para o combate à Covid-19, preconizado pelo presidente Jair Bolsonaro. Em todas, evitou ser taxativo.
 
O relator Renan Calheiros perguntou se o ministro compartilhava da opinião de Bolsonaro, que propaga o uso da cloroquina, medicamento usado no tratamento da malária e cuja ineficácia para Covid está cientificamente comprovada.
 
“Senador, essa é uma questão técnica que tem que ser enfrentada pela Conitec [Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS]. (...) Segundo o decreto-lei que regulamenta a Conitec, eu sou instância final decisória. Então, eu posso ter que dar um posicionamento acerca desse protocolo, de tal sorte que eu gostaria de manter o meu posicionamento final acerca do mérito do protocolo quando o protocolo for elaborado”, respondeu Queiroga.
 
Em outras ocasiões, o ministro disse ainda que essa “questão deve ser enfrentada de forma técnica, não em relação à opinião pessoal de qualquer cidadão brasileiro”.
 
“Eu, como ministro da Saúde, como testemunha, não tenho que fazer juízo de valor a respeito das opiniões do presidente da República”, disse.
 
Pressionado, o ministro limitou-se a dizer que a questão do tratamento precoce não é decisiva no enfrentamento à pandemia. “O que é decisivo é justamente a vacinação e as medidas não farmacológicas.”
 
Efeitos colaterais da cloroquina
Também houve questionamentos sobre os efeitos colaterais da hidroxicloroquina. O senador Otto Alencar (PSD-BA) perguntou ao ministro da Saúde, que é cardiologista, se o medicamento pode levar à parada cardíaca.
 
“Eu já falei, senador, que não só a hidroxicloroquina, como outros medicamentos que são usados 'off label'”, disse.
 
Alencar insistiu que perguntava especificamente sobre a hidroxicloroquina. “Senador, existem outros medicamentos 'off label' [usado mesmo sem indicação na bula] que podem levar a problemas, não só esse”, resistiu o ministro.
 
Otto Alencar, que é ortopedista, insistiu: “Sinceramente, nós somos médicos, estamos falando aqui na ciência. Não precisa botar a política na ciência. Eu quero saber se para o coração ou não para o uso da hidroxicloroquina de forma indeterminada por um paciente que tem doença do coração”.
 
Após dizer que já havia respondido, o ministro acabou cedendo: “Pode ter arritmias cardíacas, senador”.
 
Lockdown
Queiroga também foi questionado se é contra ou a favor o isolamento social e o lockdown.
 
“Essa questão das políticas de restrição de movimentação de pessoas tem que ser aplicada de acordo com o momento epidemiológico e com a situação de cada município, de cada Estado. O que eu acho que é necessário, para melhorar ainda mais o que podemos fazer, é o próprio Ministério da Saúde fazer um direcionamento, um disciplinamento em relação a essa questão. É isso que estamos trabalhando”, disse.
Queiroga disse que, em "cenários específicos" podem ser adotadas "medidas extremas", mas de forma generalizada, em todo país, não dá resultado, segundo afirmou.
 
“Medidas extremas podem ser colocadas em prática dentro de cenários específicos. Num município onde o estado epidemiológico está muito grave, pode-se, eventualmente, ter um fechamento maior, mas, como uma medida nacional... Nós temos um país continental, senador, e uma medida como essa não vai surtir o efeito desejado, até porque existe uma dificuldade muito forte de adesão da nossa população. Esse é o meu posicionamento”.
 
Eventual decreto do presidente
O ministro foi questionado sobre a possibilidade de o presidente da República proibir, por meio de decreto presidencial, governadores e prefeitos de determinarem medidas mais rígidas de isolamento social. Os senadores também perguntaram se o ministro concordaria com uma eventual determinação.
 
Queiroga disse que Jair Bolsonaro nunca tratou do assunto com ele e evitou adotar uma posição sobre o tema.
 
“A minha função é pugnar por políticas públicas na saúde, que elas sejam efetivas para o enfrentamento das doenças. Eu tenho, de maneira reiterada, afirmado acerca das medidas não farmacológicas, das medidas relativas ao isolamento social, e é esse o meu papel. O meu papel, como ministro, não é ser um crítico das ações, seja do presidente da República ou de outros integrantes do Governo. Eu tenho, sim, que usar a minha capacidade de convencimento para persuadir todos os brasileiros a se associarem a nós, e tomar medidas que sejam eficientes e capazes de vencer a pandemia”, afirmou o ministro.
 
Demora na aquisição de vacinas
A demora na aquisição de vacinas também foi alvo de perguntas. O ministro foi questionado se o governo demorou para firmar acordos. Em agosto de 2020, a farmacêutica Pfizer ofereceu a vacina ao Brasil, mas o governo acabou recusando na ocasião.
 
“Senador, eu assumi o Ministério da Saúde há 45 dias, e esses acordos não foram firmados na minha gestão. Eu não tenho como precisar ao senhor se houve demora, se não houve, porque eu não participei dessas negociações”, respondeu.
Ex-ministro Pazuello
Em referência ao ex-ministro Eduardo Pazuello, um dos principais alvos da CPI, o relator Renan Calheiros perguntou se a designação de uma pessoa “sem formação ou experiência em gestão de saúde para assumir o Ministério da Saúde e sua manutenção à frente da pasta por dez meses” seria adequada. Calheiros também perguntou se o ministro escolheria um secretario-executivo com esse perfil para integrar a sua equipe
 
“Senador, a competência de escolher o ministro é do presidente da República. Quem julga isso é o presidente da República, não sou eu”, respondeu.
“Senador, eu sou ministro da Saúde, não compete a mim fazer juízo de valor acerca da opinião do ministro Pazuello ou do presidente da República. O que nós fazemos, aqui no Ministério da Saúde, são recomendações sanitárias próprias para o enfrentamento da Covid-19. Isto eu tenho feito desde o primeiro dia do meu mandato: trabalhado por uma ampla campanha de vacinação, incentivado o uso de medidas não farmacológicas, procurado atender estados e municípios. O que não está na minha alçada não compete a mim emitir juízo de valor.”
 
 
Imunidade de rebanho
Queiroga também foi questionado sobre o que pensa a respeito da imunidade coletiva ou “de rebanho”, posição que já foi defendida pelo presidente Jair Bolsonaro. Por essa tese, para se obter uma imunidade coletiva, todos se contaminam. Novamente, Queiroga evitou se posicionar.
 
“A estratégia que o Ministério da Saúde defende é vacinação da população. A estratégia é vacinar a população brasileira. O problema é que, se nós defendemos esse tipo de estratégia [imunidade de rebanho], a gente pode contar com um aumento de óbitos, não é? Então, é por isso que o entendimento, e nós hoje temos uma esperança, que são as vacinas, é que as vacinas é que vão trazer, sim, a imunidade da população brasileira”, disse.
 
Perguntado se condenaria a estratégia da imunidade de rebanho, o ministro disse "não estar condenando". “Eu estou dizendo é que a estratégia é a vacinação”, afirmou.
 
O ministro, então, foi perguntado se “seria contra qualquer um que adotasse a estratégia de imunidade coletiva”.
 
“Vacinação da população é a conduta do Ministério da Saúde para superação dessa crise sanitária”, respondeu.
 
Isolamento vertical
O ministro também evitou emitir opinião sobre isolamento vertical, quando são isoladas apenas as pessoas que fazem parte do grupo de risco da Covid-19.
 
 
“Esse termo isolamento vertical entrou à baila no começo desta pandemia, mas hoje isso aí é algo que foi abandonado, não é? Então, o que nós pregamos na realidade seria o distanciamento entre as pessoas, a observação do contexto epidemiológico da pandemia e, em situações estritamente consignadas onde a pandemia está num nível maior e com colapso no sistema de saúde, eventualmente, naqueles municípios de um país continental como o Brasil, se adotarem medidas mais severas”, disse.
 
“Eu não conheço esse tipo de adoção de isolamento vertical, embora muitas pessoas defendam que aquelas pessoas mais idosas, que elas devessem ficar em casa. Eu até concordo, mas não como uma estratégia de isolamento vertical.”
 
Estoque de cloroquina
Durante o depoimento, Queiroga disse desconhecer qual é o estoque de cloroquina no Ministério da Saúde. O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) questionou o ministro se ele encontrou uma quantidade de 4 milhões de comprimidos ao assumir a pasta.
 
“Senador, eu não me ative a esse fato”, respondeu. “Não sei, senador, se há esse estoque de cloroquina no ministério. Posso buscar essas informações e trazer para vossa excelência. Existe um departamento de armazenamento de medicamentos que é um mundo.”
 
Fonte: G1

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