A Maternidade de Campinas vai ampliar a sua atuação e funcionar também como um hospital geral voltado para casos de baixa e média complexidade. Com isso, Campinas voltará a ter uma instituição de saúde na área central voltada a oferecer esse atendimento para os pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), inclusive com pronto atendimento infantil e adulto. A revelação foi feita pelo vice-presidente da Sociedade Campineira de Educação e Instrução (SCEI), monsenhor José Eduardo Meschiatti, em entrevista concedida a convite do presidente-executivo do Correio Popular, Ítalo Hamilton Barioni.
A SCEI, mantenedora da Pontifícia Universidade Católica (PUC) Campinas e do Hospital PUC, assumiu, em maio passado, a administração da Maternidade, em um momento em que ela corria o risco de fechar por estar afundada em uma dívida de R$ 142 milhões. Para monsenhor Meschiatti, mantê-la funcionando faz parte da "missão católica" defendida pelo arcebispo metropolitano de Campinas, Dom João Inácio Müller. "Chegou essa oportunidade e nós contratamos consultorias, fizemos uma avaliação plena da Maternidade. Constatamos que a situação, de fato, não era boa, mas tinha possibilidades de futuro", afirmou o vice-presidente da SCEI.
De acordo com monsenhor Meschiatti, a ampliação do atendimento é um desafio que passa por investimentos para modernização das instalações da Maternidade, uma instituição de 111 anos onde nasceram 70% dos campineiros. Para ter sustentabilidade, o atendimento deverá ser 60% voltado ao SUS e 40% aos convênios médicos. O religioso tem essa meta para cumprir junto com outras tarefas desempenhadas, entre elas de vigário-geral da Arquidiocese, moderador da Cúria e padre na Paróquia Nossa Senhora Aparecida, que está comemorando 75 anos de criação.
Em maio último, a PUC assumiu a Maternidade de Campinas, na época com uma dívida em torno de R$ 142 milhões. Por que a PUC se interessou em assumir a Maternidade em momento difícil para a instituição?
O mérito todo é do bispo Dom João Inácio Müller. No mês de agosto, mais ou menos, do ano passado, nós fomos procurados, soubemos da situação da Maternidade de Campinas, que ela estava às portas de fechar. O Ministério Público estava muito preocupado com a situação econômica, tinha ocorrido algumas situações. Chegou essa oportunidade e nós contratamos consultorias, fizemos uma avaliação plena da Maternidade. Constatamos que a situação, de fato, não era boa, mas tinha possibilidades de futuro. Mas, pesou também, sobretudo, diante desse quadro, que Dom João olhou a missão católica. Se hospital fechasse, no dia seguinte as mães, crianças estariam na rua, a sociedade campineira e da região perderia. Então, a missão foi o diferencial diante de um quadro econômico muito difícil. Dom João fez pesar aí a questão da missão católica. Claro que um grupo todo de consultorias avaliou a situação. A nossa mantenedora estudou a fundo as dívidas, os passivos, mas também olhou as possibilidades. Havia possibilidades também de Refis (renegociação de impostos), negociação das dívidas com os credores. Uma empresa contratada está cuidando da recuperação judicial.
A PUC não assumiu plenamente ainda, ela fez uma incorporação até que termine a recuperação. A mantenedora assumiu a Maternidade como majoritária. Essa foi a condição. Nós entramos para assumir de forma majoritária a gestão. Isso foi colocado em maio de 2024 e, por unanimidade, a assembleia votou pela entrada da mantenedora. Não houve nenhum voto contra, tamanha a credibilidade da PUC nesse momento para assumir. Lá são aproximadamente 110 médicos que são sócios da Maternidade, mas eles viram que a entrada da mantenedora seria a salvação do hospital.
Como está a situação financeira da Maternidade agora?
Nós assumimos conscientes das dívidas. Estamos contando com emendas parlamentares, o próprio senhor prefeito (Dário Saadi) tem sido parceiro também na busca de emendas. No ano de 2025 nós vamos receber em torno de R$ 6 milhões de emendas, justamente para o custeio, para as reformas, para o incremento. A mantenedora sabe que vai colocar ali também um investimento próprio se for o caso, mas a gente precisa sensibilizar os deputados e vereadores de Campinas para ter recursos para os investimentos necessários, Pelas contas, pelos cálculos, em três anos ela começará a dar sinais já de respiro. Então, nós acreditamos que aí vai se tornar um grande hospital. Hoje, a Maternidade realiza 700 partos por mês, sendo que 60% são pelo SUS (Sistema Único de Saúde). Isso quer dizer que grande parte dos partos pelo SUS em Campinas são realizados na Maternidade. Se ela fechasse, haveria uma grande problema para a rede de saúde pública de Campinas e também para os convênios. Os convênios privados teriam um grande problema onde realocar todo aquele atendimento de uma hora para outra. A gente sabe que outros grupos econômicos olharam o negócio, investigaram e se retiraram, não tiveram interesse. Nós tivemos a coragem de garantir que todo o trabalho da Maternidade continuasse. Ela tem 257 leitos, são 24 nascimentos por dia, duas mil internações mensais. A Maternidade conta com uns 200, 300 médicos e entre 800 e 900 funcionários. Contratamos uma empresa especializada que está fazendo a negociação com os credores.
Esse trabalho vai levar quanto tempo?
Os prazos são sempre difíceis de prever, mas nós esperamos que até o meio do ano que vem nós tenhamos solucionado essa questão dos credores. A partir daí, vamos realizar uma assembleia da recuperação judicial com esses credores e liquidar o assunto. Eu penso que no meio do ano que vem nós encerramos esse parte. Já fizemos este ano com a economia interna, com uma reorganização administrativa, a inauguração da reforma de 18 leitos. O 3º andar foi totalmente reformado, trocadas as camas, o hospital já é de primeiro mundo.
A partir da conclusão desse trabalho, quais são os planos para a Maternidade?
Então, a ideia é crescer. É ele se tornar um hospital, além de maternidade. Sem perder a identidade primeira, que é a maternidade, se tornar também um hospital geral. Aí a ideia é uma reformulação total, uma reforma total do prédio, aumento de instalações. O projeto é ter, inclusive, pronto atendimento infantil e adulto.
Essa mudança de perfil, da Maternidade passar para um hospital geral, tem prazo para ocorrer?
Ela já tem credenciamento, mas depende de instalações e investimentos. Em escala pequena já pode ser feito isso, já está habilitado. Nós temos coisas importantes a serem feitas. Toda instalação elétrica da Maternidade precisa ser trocada, o prédio é dos anos 50. Há também a questão de climatização, que ainda não é total. Os centros cirúrgicos precisam ser remodelados, modernizados. A instrumentação precisa ser modernizada, a própria hotelaria precisa ser modernizada. Então, para que o hospital também se torne atrativo, tem que fazer essa modernização. Já é assim no nosso hospital, e a gente faz bemfeito, seja para o SUS, seja para o convênio em particular. O paciente do SUS também vai usar aquilo que foi bem feito, não tem instalação de segunda categoria para o SUS e de primeira para o convênio. É a mesma instalação.
Isso é missão, é dar dignidade para as pessoas. Dom João tem essa preocupação com o pequeno, com o pobre, com o paciente. Aliás, Dom Bruno já tinha essa preocupação. Quando ele ia ao nosso hospital, via aquelas pessoas sentadas lá fora no chão, esperando na árvore, dizia que "precisamos tratar de outra forma esse povo, precisamos oferecer dignidade."
Fonte: Correio Popular