Comissão de Mortos e Desaparecidos tem reconstrução após apagão bolsonarista

01/04/2025

A Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) vive um processo de reconstrução após anos de desmonte institucional promovido pelo governo anterior. Em conversa com o ICL Notícias, a presidente Eugênia Gonzaga descreveu o cenário encontrado como “desmobilizado, sem orçamento”, com acordos prestes a vencer e sem estrutura mínima para operar.
 
“Nós encontramos a comissão desmobilizada, sem orçamento, os termos de acordo […] estavam já tudo por vencer, então tivemos que trabalhar revisando toda essa documentação”, explicou.
 
Recriada formalmente em julho de 2023, a CEMDP só retomou suas atividades práticas no final de agosto. O Plano de Atividades da comissão confirma que os termos de cooperação com instituições como a Unifesp e o laboratório internacional ICMP haviam sido abandonados e que, mesmo os recursos deixados em 2019, quase foram redirecionados.
 
“O governo anterior inclusive tentou retirar o que estava no caixa da comissão, que nós deixamos em 2019”, relatou Eugênia. Por estarem vinculadas a projetos específicos, as verbas não puderam ser usadas para outros fins.
 
O plano aprovado no final de 2023 permite agora que a comissão inicie de fato suas atividades. Entre as primeiras ações realizadas está o pagamento da indenização à família do padre João Burnier, morto pela ditadura e cujo caso estava aprovado há anos, mas sem execução. “Há duas semanas nós pagamos, finalmente, para uma sobrinha dele […] Foi um momento muito importante”, disse a presidente.
 
Comissão retomou diligências nos cemitérios
A comissão também retomou diligências em cemitérios, como os de Recife, e está planejando novas ações em Perus, Petrópolis, Vila Formosa e Araguaia. Os trabalhos contam com o reforço da Equipe de Identificação de Mortos e Desaparecidos Políticos, com profissionais contratados exclusivamente para o tema. A reestruturação da equipe, desativada em 2019, está prevista para ser oficializada em 2025.
 
Paralelamente às diligências, a comissão prepara a elaboração de um novo relatório sobre os desaparecidos políticos, com a meta de consolidar as ações realizadas desde 2014 e ampliar o escopo de atuação da política de memória. Eugênia confirmou que esse documento é uma das prioridades da gestão: “A ideia era lançar um novo relatório […] então agora a ideia também no ano que vem é fazer esse novo relatório para documentar tudo que foi feito a partir de 2014.”
 
Segundo o plano de atividades, o novo relatório deve incluir setores historicamente ignorados pelas políticas de reparação do Estado, como indígenas, camponeses, moradores de periferias urbanas e a população negra. Também está previsto o acolhimento de novos casos e o reconhecimento de vítimas da repressão ocorrida após a redemocratização, além de sugestões para o reconhecimento de figuras como João Goulart e Juscelino Kubitschek.
 
A elaboração do relatório se somará a uma agenda mais ampla, que inclui a articulação com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para retificar oficialmente certidões de óbito de desaparecidos políticos. A proposta, atualmente em tramitação sob relatoria do presidente Luís Roberto Barroso, busca que os cartórios reconheçam, de forma padronizada, o vínculo entre as mortes e a violência de Estado.
 
Para este ano a Comissão pretende entregar o novo relatório e realizar o II Encontro Nacional de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, marco dos 30 anos da CEMDP. “Esse trabalho de reestruturação nós conseguimos fazer no ano passado”, resume Eugênia. Agora, com o plano aprovado e a equipe novamente ativa, a CEMDP tenta recuperar o tempo perdido e, ao mesmo tempo, ampliar o alcance da justiça de transição no Brasil.
 
Fonte: ICL Notícias

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